terça-feira, 26 de novembro de 2013

Natal tem ato público nacional em defesa dos mandatos do PSTU e do PSOL

O ato público foi uma resposta à clara tentativa de criminalizar os mandatos

Ato saiu em passeata até a Câmara Municipal de Natal
Na segunda-feira, 18, cerca de 250 pessoas participaram do ato em defesa dos mandatos dos vereadores Amanda Gurgel (PSTU) e Sandro Pimentel (PSOL) e contra os ataques ao vereador Marco Antonio (PSOL). Os  três são alvos de uma campanha que busca intimidá-los e reduzir sua atuação dentro da Câmara e de apoio aos movimentos sociais. Os dois primeiros já respondem a denúncias na Comissão de Ética da Câmara dos Vereadores de Natal por quebra de decoro parlamentar. Sandro já prestou depoimento, nesta quarta, 20, acusado por ter dito que os estudantes não deveriam ter pichado a Câmara, mas sim alguns vereadores. E Amanda foi denunciada após dizer que há na Câmara uma "bancada do Seturn", o poderoso sindicato dos empresários de ônibus.

Os três parlamentares têm sido duramente atacados em Plenário em uma clara tentativa de criminalização de seus mandatos. Os vereadores chegaram até a ser denunciados na delegacia pelo vereador Adão Eridan (PR), condenado pela Justiça por participação na Operação Impacto, um escândalo de corrupção que desmoralizou a Câmara na legislatura anterior. O mesmo vereador afirmou que Amanda Gurgel não deveria confiar tanto na Lei Maria da Penha, em uma clara ameaça física e machista à vereadora.

“Quem mexe com a formiga, assanha o formigueiro”
O ato público foi uma resposta aos ataques. O auditório estava lotado, com muitos lutadores que acompanham as ações dos mandatos. Os sem-terra formavam a maior delegação. O representante do MST-RN anunciou. “Natal não é de meia-dúzia de vereadores. Não ousem tirar os nossos vereadores. Porque se ousarem, nós vamos colocar eles lá dentro de novo à força. Nós, os trabalhadores.”
Estavam lá também vigilantes do SindForte, estudantes que lutam pelo passe-livre, da ANEL, do Juntos, do Reviravolta e do coletivo Construção; professores; representantes do Sindicato dos Bancários; da CSP-Conlutas e da Intersindical; do sindicato do transporte alternativo (Sitoparn); e muitos moradores de bairros da periferia, entre outros lutadores. Um destaque foi a delegação dos grevistas da saúde de Natal, do Sindsaúde, que havia ocupado a prefeitura no mesmo dia, pela manhã.

O Movimento Mulheres em Luta (MML) também participou do ato e divulgou nota de solidariedade à Amanda Gurgel contra as agressões machistas sofridas pela vereadora.


Apoio nacional
O ato reuniu diversos parlamentares do PSOL e do PSTU, de representantes do PSOL de Alagoas e do PSTU da Paraíba, além de mensagens e moções que chegaram de diversas regiões. Um vídeo enviado pelo vereador Cleber Rabelo, do PSTU de Belém (PA), foi exibido durante o ato. Além dos dois partidos, o ato contou com a presença do vereador Hugo Manso (PT) e de um representante do mandato de Fernando Lucena (PT) que também expressaram a solidariedade aos vereadores. Em vídeo, Vera Lúcia, presidente estadual do PSTU em Sergipe, também enviou solidariedade aos vereadores.

O presidente nacional do PSTU, Zé Maria, também esteve presente e relacionou os ataques aos vereadores aos diversos casos de criminalização dos movimentos sociais no País. “O país mudou desde junho. Agora, a burguesia está tentando retomar o controle, quer evitar a continuidade da nossa luta. Está preocupada com outro junho, o de 2014, quando o país vai ser mais uma vez governado pela Fifa e o país vai parar de novo. Por isso tanta criminalização dos movimentos, por isso a repressão aos mandatos. O que está acontecendo aqui é o mesmo que se abate contra os estudantes presos em São Paulo, contra os sem-terra do Pontal do Paranapanema, contra os grevistas da saúde daqui de Natal, que foram recebidos com spray pimenta hoje na Prefeitura. Esses setores têm em Amanda, Sandro e Marcos, inimigos irreconciliáveis. Responder a esse processo significa defender as nossas bandeiras, dos trabalhadores e da juventude. A melhor resposta aos ataques é continuarmos lutando. Podem se preparar porque só estamos começando”, afirmou. 

domingo, 24 de novembro de 2013

8ª Marcha da Periferia: Uma marcha de raça, classe, cores e ritmo

Informação escrita pela CSP Conlutas Maranhão

Na melhor de todas as marchas, a luta pela titulação das terras quilombolas e denúncia de violência policial deram o tom da manifestação que tomou conta do Centro da cidade nesta sexta-feira, dia 22 de novembro. Militantes de diversas organizações do Maranhão e do Piauí se concentraram no início da tarde em frente à Praça Deodoro com bandeiras, faixas, bumbos e tambores na VIII Marcha da Periferia que tinha como tema Pelos Amarildos... da Copa eu abro mão.
Uma coluna formada por quilombolas da região da baixada maranhense era destaque da marcha com suas bandeiras coloridas e seus cantos ritmados. Reunidos no MOQUIBOM (Movimento Quilombola da Baixada Maranhense), umas das principais organizações surgidas no últimos anos na luta contra a violência no campo e pela titulação de suas terras, os quilombolas revezavam seus cânticos com as palavras de ordem da bateria dos estudantes da ANEL (Assembléia Nacional dos Estudantes Livre).
A Marcha parou o trânsito por alguns momentos e caminhou até o Palácio dos Leões, sede do governo estadual, que estava como de praxe, com grades e policiais a todo seu redor. Assim como na abertura da Marcha, fez uma fala Dona Maria da Natividade, mãe do jovem Luis Leônidas, jovem de 21 anos, que estava recém-empregado em um supermercado da cidade e foi baleado pela Polícia Militar que achava que seria um ladrão. No fim de sua fala ela cantou emocionada a música da banda Legião Urbana Pais e Filhos.
Apesar de não sediar grandes eventos, o Maranhão é um estado que sofre com o aumento da violência praticada contra os negros e pobres. O Governo Roseana Sarney é responsável pelos resultados catastróficos na saúde, na educação e no saneamento básico que deixam a juventude de periferia sem perspectiva nenhuma de vida. 
Atividade internacional e grande kizomba no Centro Histórico
Este ano a marcha contou com a participação internacional da militante do movimento negro inglês Stephanie Bennett que também teve o irmão gêmeo vitimado pela Polícia inglesa. Ela denunciou uma série de casos de assassinatos cometidos pela Política no seu país. Na noite anterior, a inglesa participou de um debate com o Quilombo Raça e Classe. Ao final do debate, diversos artistas negros se apresentaram em um sarau realizado ao redor de grandes casarões históricos.
A Marcha organizada pelo Quilombo Urbano desde 2006 contou com apoio de diversas entidades como a CSP Conlutas, ANDES, Sinasefe Nacional e Seção Monte Castelo, Sintrajufe, Bancários Maranhão, ANEL, DCE-UFMA, MOQUIBOM, CPT-MA, Sindserm-Teresina.

terça-feira, 19 de novembro de 2013

JUSTIÇA MANDA MENSALEIROS PARA CADEIA. E AGORA?

DO SITE OFICIAL DO PSTU

Genoíno e Dirceu chegam em Brasília escoltados pela PF
Foto: Agência Brasil
Na última sexta-feira, 15, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, expediu os primeiros mandados de prisão contra os condenados do processo do mensalão. Entre eles estavam importantes dirigentes do Partido dos Trabalhadores, como José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil de Lula, e José Genoíno, ex-presidente do partido.  Em seguida, sob a custódia provisória da Polícia Federal em Brasília, foram transferidos para complexo penitenciário da Papuda.  Também foi preso o ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares. Henrique Pizzolato, quadro do partido e ex-diretor do Banco do Brasil optou pela fuga para a Itália, segundo seu advogado.
A imagem dos dois dirigentes do PT, com os punhos cerrados ao serem presos pela Polícia Federal em São Paulo, seria trágica se não fosse irônica. Ambos afirmaram que foram presos devido a uma conspiração das elites em conluio com a grande mídia. Ambos defendem a tese de que o mensalão – o pagamento de propina a deputados da base aliada do governo Lula – nunca existiu. Ambos evocam o passado de lutas contra a ditadura militar para mostrar a “injustiça” a qual supostamente foram submetidos.
Contudo, cabe perguntar: os defensores da reforma da Previdência (realizada em 2003) e da privatização do Pré-sal estão sendo perseguidos pelas mesmas elites rancorosas que apóiam a reforma da Previdência e o leilão do Pré-sal? Isso para não mencionar o apoio dado por essas mesmas elites ao conjunto da política econômica aplicada há 10 anos por este governo.
Opção de classe
Ao chegarem ao poder, os dirigentes do PT fizeram uma opção: traíram a expectativa de mudança alimentada por milhões e passaram a gerenciar os negócios dos grandes capitalistas e banqueiros. O primeiro sinal neste sentido veio já com a chama “Carta ao Povo Brasileiro”, lançada pelo então candidato Lula em 2002. Nela, o candidato tranquilizava os investidores internacionais e as instituições do capital financeiro - Banco Mundial, FMI, etc. – afirmando que manteria a “estabilidade econômica” do país. Um eufemismo para designar a opção em manter o tripé da política econômica do governo FHC: superávit primário, câmbio flutuante e controle inflacionário. A estes senhores, o PT não decepcionou. “Nunca antes neste país”, os empresários e banqueiros lucraram tanto, enquanto os serviços públicos continuam em frangalhos e a reforma agrária nunca saiu do papel.
Como se não bastasse, o PT manteve a mesma corrupção do PSDB. Aparelhou o Estado, desviou dinheiro para financiar campanhas eleitorais e beneficiou “empresários companheiros” (o caso de Eike Batista é emblemático) por meio de generosos empréstimos do BNDES.
Muitos dirigentes do PT, oriundo do movimento organizado dos trabalhadores, tornaram-se empresários, “consultores de negócios” e lobistas, como o próprio José Dirceu, “consultor” do mega empresário mexicano Carlos Slim, um dos homens mais ricos do mundo. Outros dirigentes administram diretamente grandes negócios capitalistas via fundos de pensão das estatais, hoje de enorme relevância para o capital financeiro.  “É preciso ajudar eles para que eles possam nos ajudar”, teria dito o ex-ministro Luiz Gushiken (morto no dia 13 de setembro, vítima de um câncer) a um ex-diretor de uma importante estatal.  Eis a lógica pela qual se pautou os dirigentes do PT.
Também não deixa de ser irônico o fato de o PT, ao assumir o governo, ter varrido toda a sujeira do governo tucano para debaixo do tapete. As privatizações das estatais, como Vale do Rio Doce, Telebrás, etc., talvez tenham sidom em seu conjunto, o maior caso de corrupção da história recente do país. Contudo, ao invés de reestatizar as empresas entregues a preço de banana ao capital estrangeiro e colocar a canalha tucana na cadeia, o PT de Dirceu e José Genoino preferiu optar pela “governabilidade”. Assim realizaram uma aliança com que há de mais espúrio na política brasileira: Renan Calheiros, Collor e Sarney.
O PT sempre disse que mudaria o sistema “por dentro” quando chegasse ao poder. Quem mudou, entretanto, foram seus dirigentes. Isso porque, na democracia dos ricos, os altos cargos da administração pública são utilizados como instrumentos dos grupos políticos que estão no poder para oferecer benefícios aos grupos empresariais. Estes, em troca, financiam as campanhas eleitorais dos políticos donos dos cargos. A corrupção é parte essencial do sistema político e do Estado capitalista. Dirceu e Genoino aceitaram a jogar as regras do jogo.
Presos políticos?
Não deixa de ser absurdo o argumento utilizado pelos dirigentes do PT, de que são “prisioneiros políticos”. Ora, prisioneiros políticos foram as centenas de manifestantes detidos nos protestos de junho para cá. Presos, diga-se de passagem, pelos governos aliados do governo Dilma, como Sérgio Cabral (PMDB), ou até mesmo pelos governos do próprio PT, como o de Tarso Genro, no Rio Grande do Sul.
Hoje, centenas de jovens ativistas respondem inquéritos criminais absurdos, com acusações mentirosas e ridículas. Até mesmo a velha Lei de Segurança Nacional da ditadura foi evocada para prender manifestantes.  Genoíno e Dirceu não ergueram os punhos em apoio às manifestações de junho, nem durante a greve dos professores do Rio de Janeiro! Não ergueram os punhos para defender os povos indígenas assassinado por pistoleiros do agronegócio!
A verdade é que os governo do PT, PSDB e partidos aliados estão ávidos em colocar um ponto final nos protestos que sacodem o país. Por isso criminalizam a luta social e não tem escrúpulos em realizar centenas de verdadeiras prisões políticas.
É preciso mais, muito mais
Também não confiamos no STF, que agora tenta bancar o paladino da Justiça, mas que livrou da cadeia Collor, Maluf e Daniel Dantas. Como confiar num tribunal que se recusa anular a votação da Reforma da Previdência a qual, segundo ele próprio, foi aprovada de forma fraudulenta?
Mesmo as prisões de Dirceu, Genoíno, Marcos Valério e os demais ‘mensaleiros’ são absolutamente insuficientes e expressam o caráter de classe dessa Justiça. Após serem condenados pelo desvio de milhões, a maior parte vai cumprir poucos anos em regime semi-aberto e não serão obrigados a devolverem o que foi desviado. Enquanto isso, o morador de rua Rafael Vieira está há cinco meses preso no Rio de Janeiro após ser detido por policiais que acharam que os frascos de Pinho Sol e água sanitária que carregava fossem coquetéis molotovs. Mesmo após laudo ter comprovado não serem materiais explosivos, Rafael continua preso no complexo presidiário de Japeri.
Grande parte dos que se indignaram ao verem Genoíno e Zé Dirceu serem presos não mostrou a mesma reação com as detenções arbitrárias e os processos de exceção que se espalharam pelo país nos últimos meses.
Por fim, é realmente asquerosa a hipocrisia da direita tradicional do país. Seus cães raivosos, colunistas de Veja ou coisa pior, pagos a preço de ouro, apresentam o julgamento como uma evidência de que a corrupção na política brasileira é obra exclusiva do PT. A verdade é que PSDB e DEM estão mergulhados até o pescoço no mar de lama. Além das “privatarias”, há ainda existência do mensalão de Minas, envolvendo o PSDB, e das inúmeras maracutaias de FHC, com a compra de votos no Congresso Nacional.
O escândalo do metrô de São Paulo, que revelou o pagamento de propinas pela empresa Alston aos cardeais do tucanato, é a maior demonstração de que eles ainda continuam saqueando os cofres públicos.
Não acabou. É preciso investigar todas as denúncias de corrupção do PSDB e dos corruptos listados a cima, punir e confiscar os bens dos corruptos e corruptores. Se não o fizer, estará apenas confirmando mais uma vez o caráter político, e não jurídico, da atuação dos tribunais e dessa Justiça.

terça-feira, 12 de novembro de 2013

ONDE OS MARXISTAS E ANARQUISTAS SE UNEM E ONDE TEM DESACORDO? (Titulo original: Marxismo e anarquismo)

Henrique Canary, da Secretaria Nacional de Formação do PSTU


Desde junho, com as enormes mobilizações que tomaram conta do país, a bandeira negra da anarquia voltou a tremular nas ruas e praças das grandes cidades. Ao lado das bandeiras vermelhas das organizações socialistas, anarquistas de inúmeras vertentes cerraram fileiras, enfrentaram o inimigo comum, foram presos e agredidos, e também conquistaram vitórias. O anarquismo voltou a ser uma referência para muitos jovens que, desiludidos com a podridão dos partidos oficiais, encontram nas ideias libertárias um novo horizonte pelo qual – pensam eles – valeria a pena lutar.
Não é de se admirar. A maioria dos partidos que se dizem socialistas tem suas bandeiras manchadas pelas traições políticas que cometeram contra as lutas dos trabalhadores. E não só isso: desde o dia 21 de outubro – quando o martelo bateu no Hotel Windsor na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, e o Campo de Libra foi entregue às multinacionais – algumas dessas bandeiras vermelhas, como a do PT e a do PCdoB, ficaram manchadas também com o sangue da juventude e dos trabalhadores, massacrados e perseguidos pelo Exército, em uma das caçada mais violentas contra uma manifestação desde junho, tudo isso a mando de Dilma e Cabral.
Mas a justa desilusão com algumas organizações ditas socialistas e o engajamento sincero destes jovens na luta do povo não podem nos eximir de um debate sério a respeito da estratégia anarquista. Não nos referimos aqui ao debate político sobre as ações de grupos como os Black Blocs, que embora tenham inspiração anarquista, não podem ser igualados ao próprio movimento anarquista. Com essas organizações, travamos e continuaremos travando polêmicas políticas públicas sempre que sua prática contradiga os interesses do movimento. Referimos-nos aqui ao anarquismo em si, à teoria política, social e econômica que serve de inspiração a essas organizações e a inúmeras outras.
Se o inimigo está armado até os dentes com bombas e fuzis, nossa melhor e mais importante arma é a justa compreensão dos acontecimentos, ideias e fenômenos que nos cercam. Isso inclui compreender o anarquismo.
O que é o anarquismo
Para começar, evitemos as caricaturas. O termo anarquia provém do grego (an + arkhos) e quer dizer “ausência de governo” ou “ausência de poder”. Ou seja, anarquia não quer dizer “ausência de ordem” ou “desordem”, como em geral se pensa. Ao contrário, os anarquistas visam estabelecer a mais completa e perfeita ordem social. Porém, acreditam que esta ordem só pode ser estabelecida se todo governo e todo poder forem abolidos.
Como doutrina política, o anarquismo se caracteriza pela luta contra o Estado. Os anarquistas acreditam que o Estado – esta instituição política que concentra todas as funções de governo, administração e repressão em nossa sociedade – é o responsável pela falta de liberdade do homem. Pregam que o Estado, com suas forças armadas, suas escolas, suas leis, seus impostos, sua religião oficial etc., é a fonte de toda injustiça, desigualdade e miséria espiritual em que vivemos. A tarefa consistiria, portanto, em acabar com esta instituição, abolí-la imediatamente e por completo, e instaurar o auto-governo da população em geral e de cada indivíduo em particular.
Segundo os anarquistas, ao invés de Estados nacionais centralizados, como existe hoje, a sociedade deveria se organizar em “comunas livres”, ou seja, pequenas comunidades de caráter local, auto-governadas, independentes umas das outras, não submetidas a qualquer comando ou lei geral. Essas comunas (a denominação pode variar de autor para autor) seriam unidades políticas e econômicas totalmente autônomas, cada uma com seu próprio sistema de produção e distribuição de riquezas, e que viveriam do livre intercâmbio de bens e serviços umas com as outras.
Os anarquistas pensam que o que torna o homem mesquinho, violento e egoísta é o próprio Estado e que, uma vez que este seja abolido, as pessoas viverão em harmonia, resolvendo elas próprias seus problemas, vivendo sua vida de maneira pacífica e auto-suficiente, sem a necessidade de qualquer lei escrita, instituição especial, controle, repressão etc.
Sobre os inimigos da liberdade e do povo, os anarquistas afirmam que se o Estado for abolido, nada mais restará a estes senhores, uma vez que eles são a ínfima minoria na sociedade, e sua dominação se baseia exclusivamente no poder do Estado.
Da mesma forma que renegam todo e qualquer Estado (inclusive a hipótese de um Estado controlado pelos trabalhadores), os anarquistas, em geral, renegam também os partidos políticos da classe trabalhadora. Segundo eles (repetimos: há distintas vertentes e pode haver matizes entre elas), todo partido é uma estrutura hierárquica, vertical, organizada nacionalmente, e portanto oposta ao ideal de liberdade e auto-governo inerente ao anarquismo. Assim, toda ação do povo deve se dar de maneira auto-organizada, sem uma direção específica.
Estes são, em linhas gerais, os princípios mais importantes do anarquismo. Como dissemos acima, não há somente um anarquismo, mas vários, e por isso toda generalização pode conter imprecisões. Esperamos não ter distorcido qualquer das ideias aqui apresentadas, pois o objetivo desta parte do texto era tão somente uma exposição sintética do anarquismo, e não sua crítica.
A crítica marxista ao anarquismo é a que segue.
A questão do Estado
O marxismo reconhece o Estado como uma das mais cruéis e sanguinárias instituições. Certamente, o Estado oprime e esmaga, e junto com os anarquistas, os marxistas declaram que seu objetivo último é o fim do Estado e a construção de uma sociedade de produtores livres auto-organizados. Mas infelizmente, terminam aí nossas coincidências.
Diferente do anarquismo, o marxismo não vê o Estado como criador da miséria ou da desigualdade, nem como a origem da opressão ou da falta de liberdade humana. Para os marxistas, o Estado é apenas o produto de uma determinada realidade social.
Segundo o marxismo, o mal fundamental da sociedade é a propriedade privada dos meios de produção (fábricas, bancos, terras, empresas etc), ou seja, o fato de que a sociedade se encontra dividida em classes sociais opostas: explorados e exploradores. O Estado existe porque a dominação econômica de uma classe sobre a outra precisa ser fixada na forma de leis, instituições, ideias. E depois, se preciso, defendida com armas. Se não houvesse esta organização especial chamada Estado, as classes sociais se degladiariam em uma luta sem fim e a sociedade entraria em colapso. A exploração econômica, para que seja estável, precisa de seu complemento: a dominação política, militar e ideológica – o Estado. Por isso o Estado é sempre o Estado da classe dominante.
Ou seja, o Estado é a ferramenta da qual se utilizam os exploradores para perpetuar sua dominação. Mas ele não é a própria dominação. Longe de ser uma realidade autônoma, com vida própria, o Estado não passa de um instrumento nas mãos de uma classe.
Assim, o marxismo acredita que não é possível abolir o Estado enquanto não sejam abolidas as condições materiais (sociais e econômicas) que levaram ao aparecimento deste Estado. Ao se abolir o Estado por simples decreto, permanecerão as condições que o criaram (propriedade privada, desigualdade) e portanto seu renascimento, em um prazo mais ou menos curto, é simplesmente inevitável.
O Estado dos trabalhadores
Marx afirmou que o Estado era sempre o Estado da classe dominante. Essa definição fundamental determina também a visão do marxismo sobre a revolução socialista e as tarefas do proletariado depois da derrubada da burguesia.
Para o criador do socialismo científico, a classe trabalhadora, ao expulsar os capitalistas do poder, não poderia simplesmente “ocupar” o antigo Estado burguês e usá-lo no seu interesse. Ela precisaria destruir o antigo Estado, com todas as suas instituições, leis, hierarquia etc. Mas uma vez destruído este Estado, o proletariado seria obrigado, pela própria realidade, a construir outro, completamente distinto do anterior, baseado nas organizações da classe trabalhadora e controlado por esta – mas ainda assim um Estado. Segundo Marx, a máquina estatal era necessária ao proletariado para: 1) vencer a resistência dos antigos exploradores, que, não aceitando pacificamente a derrota, se organizariam para retomar o poder e restabelecer seu domínio; 2) reconstruir a sociedade sobre novas bases igualitárias, ou seja, a transição econômica socialista. Estas duas complexas tarefas ocupariam todo um período histórico. Foi o que Marx chamou deditadura do proletariado.
Os trabalhadores, embora sejam a imensa maioria da sociedade, são uma classe explorada, oprimida e alienada, que depois de derrotar uma minoria extremamente ativa, culta, violenta e poderosa, precisa realizar uma gigantesca obra histórica. Por isso, o proletariado cometeria um suicídio histórico se abrisse mão do poder de Estado.
A dissolução do Estado para o marxismo
Mas os trabalhadores, segundo Marx, não tomam o poder de Estado para eternizar sua dominação. Ao contrário, uma vez vencida a resistência da burguesia, o proletariado começa a trabalhar para aumentar a riqueza produzida, distribuí-la equitativamente, e com isso acabar com toda e qualquer diferenciação social. Com o fim das diferenciações sociais e depois de um longo processo histórico de reeducação do homem, a sociedade poderá abolir o Estado como instrumento de dominação e controle, mantendo dele apenas as funções técnicas de administração econômica, contabilidade, assistência etc. A dissolução do Estado na comunidade de produtores livres auto-organizados corresponde ao início da fase comunista de desenvolvimento da sociedade. Leon Trotsky, o grande dirigente da Revolução Russa da 1917, combatia aqueles que qualificavam de “utopia” a estratégia da dissolução do Estado, e explicava de maneira simples o conteúdo científico do marxismo: “A base material do comunismo deve consistir em um desenvolvimento do poder econômico do homem de tal modo que o trabalho produtivo, deixando de ser uma carga e um incômodo, não tenha a necessidade de qualquer coação; nem existam outros controles sobre a distribuição, além dos da educação, do hábito e da opinião pública, exatamente como é hoje em uma família abastada. É necessário, para falar francamente, uma grande dose de estupidez para considerar como utópica uma perspectiva, em definitivo, tão modesta.” A Revolução Traída.
Como se vê, diferente do anarquismo, que imagina uma revolução e um homem ideais, o marxismo tem consciência das enormes dificuldades que o proletariado (herdeiro de toda a miséria e podridão capitalistas) enfrentará na luta pela sua libertação. Consequentemente, o marxismo reconhece a necessidade de um longo período de luta e desenvolvimento social, até que as bases materiais que deram origem ao Estado tenham desaparecido, e este possa ser abolido. Mesmo assim, a abolição do Estado (que corresponde à libertação definitiva de toda a humanidade) será lenta e gradual, se assemelhando muito mais a um “desaparecimento progressivo”, que ocorrerá na mesma velocidade em que a sociedade vá assumindo em suas próprias mãos as funções de administração e controle.
Ao analisarmos apenas a questão do Estado, já salta aos olhos o caráter utópico da teoria anarquista. Mas esta é apenas a ponta do iceberg. Ao abordar outras questões, como a economia do período pós-revolucionário, a relação indivíduo-sociedade e outras, o anarquismo revelará não apenas sua natureza romântica, mas pior (é preciso que se diga com todas as letras): o enorme retrocesso que sua implementação significaria para todo o desenvolvimento humano e social. Mas estes são aspectos que trataremos na segunda parte deste artigo. Esperamos que o leitor nos acompanhe com interesse.
Originalmente publicado no Opinião Socialista 471

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Zé Maria divulga carta aberta ao PSOL e PCB Uma alternativa de classe e socialista nas eleições de 2014


O debate sobre as eleições do ano que vem já está nas ruas. É alimentado pela imensa máquina de propaganda do governo da presidenta Dilma Rousseff,  candidata à reeleição, e também pelo esforço de seus principais adversários: Aécio Neves, do PSDB, e pela aliança Eduardo Campos/Marina Silva, do PSB e REDE. A esquerda socialista brasileira precisa se apresentar neste debate e, ao fazê-lo, apontar uma alternativa de classe e socialista para os trabalhadores e a juventude do nosso país.
As eleições de 2014 vão acontecer após o terceiro mandato petista à frente do governo federal e também das manifestações que varreram o país no mês de junho passado e que mudaram substancialmente a situação política brasileira.
O desgaste do PT
Os governos do PT souberam usar a situação diferenciada do Brasil na economia (crescimento na era Lula e recuperação rápida na crise de 2008), para angariar apoio popular, ao mesmo tempo em que mantiveram e aprofundaram um modelo econômico que em nada ficou devendo àquele aplicado pelos governos tucanos de FHC.
No entanto, este apoio popular começou a sofrer uma forte erosão a partir das manifestações de junho. Milhões foram às ruas, com a juventude à frente, para protestar contra a situação dos transportes, da saúde pública, da educação, da corrupção e um longo etc. Este imenso processo de mobilização colocou o movimento de massas na ofensiva em nosso país, deixando na defensiva a classe dominante e seus governos. Avançou também a experiência dos trabalhadores com o governo petista em episódios como o do leilão de Libra, que avançou na privatização das reservas de petróleo do nosso país, e ainda com a utilização do Exército na repressão aos movimentos sociais.
Este quadro político eleva o grau de desgaste do governo petista e amplia o espaço e as possibilidades para a construção de alternativas à esquerda. Neste sentido, não deixa de ser uma referência o resultado eleitoral, muito positivo, que teve a esquerda socialista argentina nas eleições parlamentares ocorridas recentemente naquele país.
Precisamos apresentar uma alternativa que, ao mesmo tempo faça um balanço dos governos do PT numa perspectiva de classe e socialista, e também, por óbvio, faça a crítica das outras opções da burguesia que estão disputando a consciência da população, como é o caso de Aécio Neves e Eduardo Campos/Marina.
Marina Silva é uma opção?
Marina Silva buscou construir para si, durante todo este período em que tentou viabilizar o seu partido, a Rede Sustentabilidade, uma imagem de alternativa à chamada velha política, centrando sua proposta na defesa do meio ambiente e das demandas das ruas expressas nas mobilizações de junho. No entanto, o seu passado no governo do PT, quando apoiou a legalização dos transgênicos no Brasil e a Lei que autorizou o arrendamento de áreas da floresta amazônica às madeireiras internacionais, desmente claramente qualquer compromisso com o meio ambiente. E a apressada aliança com Eduardo Campos do PSB, para viabilizar uma candidatura no próximo ano, mostra que a defesa da “nova política” e das demandas de junho não passam de pura retórica.
Uma alternativa de classe e socialista para os trabalhadores
Todos nós sabemos que as eleições não são o terreno fundamental da luta que devemos travar contra a burguesia e o capitalismo. O espaço fundamental deste enfrentamento é a luta direta, a organização e a mobilização dos trabalhadores e jovens em defesa de seus direitos e interesses. Mas também sabemos que a disputa que acontecerá nas eleições do ano que vem será, sim, um momento importante desta luta. Estará em jogo a disputa pela consciência da nossa classe em torno aos diferentes projetos para o país. E disputar a consciência e o voto da nossa classe para uma alternativa de classe e socialista é obrigação da esquerda socialista brasileira.
É a partir desta compreensão que o PSTU entende ser necessária a apresentação de uma candidatura classista e socialista nas eleições do ano que vem. Uma candidatura que não, necessariamente, precisa ser do nosso partido. Pode ser a expressão de uma frente de esquerda envolvendo os partidos da esquerda socialista que estão na oposição ao governo Dilma. Nesta carta aberta ao PSOL, que prepara o seu Congresso nacional neste momento, e ao PCB, queremos explorar esta possibilidade. A de que a candidatura classista e socialista às eleições do ano que vem seja expressão de uma Frente de Esquerda envolvendo o PSTU, PSOL e PCB.
Uma candidatura desta natureza precisa obedecer a vários critérios. Deve levantar um programa de classe, anticapitalista, que aponte a transição necessária do sistema em que vivemos para uma sociedade socialista; precisa ser isenta de qualquer relação ou participação de setores da burguesia, sob pena de repetir a trajetória do PT; precisa ser independente politicamente da burguesia e, para isso, como é obvio, não pode receber dela nenhum tipo de financiamento; e precisa ser uma candidatura a serviço das lutas e do fortalecimento da organização dos trabalhadores e da juventude.
Adiantamos estas opiniões aqui porque nos preocupam processos e exemplos que estão em curso neste momento, com a participação do PSOL, e que apontam em sentido diverso. É o caso da situação na prefeitura de Macapá. A aliança feita para eleger o prefeito e, depois, para governar, envolvendo vários setores da burguesia, está levando a um governo que ao invés de se apoiar nas lutas dos trabalhadores para mudar a vida do povo, acaba se enfrentando com as lutas para defender a manutenção do status quo. É o que ocorreu na última greve dos professores naquela cidade. Tampouco podemos ignorar os episódios de financiamento por empresas de candidaturas deste partido nas eleições passadas.
A Frente de Esquerda que possa abrigar uma candidatura de classe e socialista precisa, antes de tudo, se colocar de acordo sobre os critérios políticos acima apresentados, ainda que não tenhamos acordo em relação aos elementos de balanço aqui expostos. E, superadas estas questões, precisa ser organizada de forma a respeitar os espaços de cada um dos partidos que venham a compô-la, seja no que diz respeito à candidatura a vice, na utilização do tempo de TV e mesmo nas definições de coligações nos estados.
Nós vivemos um momento ímpar em nosso país. As manifestações que ocorreram no Brasil a partir de junho mudaram o quadro político nacional e aproximaram o Brasil do cenário político mundial, marcado pelas lutas heroicas dos trabalhadores e jovens do Norte da África e Oriente Médio e pela resistência dos povos da Europa. A esquerda socialista brasileira está ante o desafio de, nesta nova situação, fazer avançar a luta e a organização dos trabalhadores e todos os setores explorados e oprimidos em nosso país. Só assim o recrudescimento das lutas do nosso povo nos levará a mudanças efetivas no país e na vida dos trabalhadores e jovens brasileiros. A disputa colocada nas eleições do ano que vem será um momento importante deste desafio. Precisamos nos colocar a altura dele.
Saudações socialistas,
Zé Maria, Presidente Nacional do PSTU