terça-feira, 17 de abril de 2012

Homem versus Máquin: Em nenhum outro período de recuperação desde a 2ª Guerra Mundial, as empresas norte-americanas foram tão rápidas em impulsionar seus gastos em máquinas e softwares e, ao mesmo tempo, tão lentas em contratar pessoas para operá-los. Isso intriga os economistas do sistema.

Por José Martins, Economista do Núcleo Treze de Maio.

Uma coisa muito importante na dinâmica do ciclo periódico é a renovação (ou reprodução) do capital fixo na economia nacional reguladora do sistema. Uma onda generalizada de investimentos capitalistas em novas máquinas e softwares em um curto espaço de tempo ocorre no início de um novo período de expansão. É o sinal mais claro (e necessário) da retomada para mais um período de expansão global. Nos dois últimos anos, esta renovação do capital fixo está batendo recordes na economia de ponta do sistema. Veja os números abaixo.

INVESTIMENTO FIXO 2007 2008 2009 2010 2011
Total das Empresas 6,5 - 0,8 - 17,8 4,4 8,7
Estruturas 14,1 6,4 - 21,2 -15,8 4,4
Equipamentos 3,3 - 4,3 - 16,0 14,6 10,3
Fonte: Bureau of Economic Analyses – National Data (Select NIPA Tables) – Março 2012 www.bea.gov

É uma clássica evolução cíclica e periódica do capital, tal como descrito por Marx e Engels. Nada de crise permanente e outras asneiras. Verifica-se claramente a passagem do auge do ciclo anterior (2007) para o período de crise (2008/2009) e, finalmente, para a recuperação atual (2010/2011). O ritmo de retomada dos investimentos em capital fixo do total das empresas (que chegou ao fundo do poço em 2009) é extremamente vigoroso e crescente nos dois últimos anos.

A evolução do item estruturas, que diz respeito a investimentos em novos prédios e instalações em geral, é muito importante porque indica o início da reprodução ampliada da capacidade instalada, não apenas reutilização da antiga. Acumulação ampliada do capital para novo e mais elevado período de superprodução.

O item equipamentos (máquinas e software) exprime a gigantesca onda de investimentos recorde de todos os períodos de recuperação dos ciclos anteriores. E uma coisa rara e extremamente importante: essa onda recorde de emprego do capital ocorre simultaneamente a uma persistência dos elevados níveis de desemprego da força de trabalho. Emprego recorde do capital de um lado, desemprego do trabalho de outro. Isso intriga os economistas vulgares. Vejamos com mais detalhes esta explosiva combinação de homens versus máquinas.

“EFEITO RICARDO” – O titulo deste boletim foi copiado de uma excelente matéria do The Wall Street Journal, o maior jornal de negócios do mundo. 1 O conteúdo é o seguinte: “em nenhum outro período de recuperação desde a 2ª Guerra Mundial, as empresas norte-americanas foram tão rápidas em impulsionar seus gastos em máquinas e softwares e, ao mesmo tempo, tão lentas em contratar pessoas para operá-los”.

O restante da matéria é rico em detalhes e exemplos concretos do característico método da substituição de trabalho vivo (trabalhadores) por trabalho morto (máquinas e matérias primas) na produção do capital. O mesmo método de que falava David Ricardo (não sem uma grande decepção com as ilusórias virtudes do regime capitalista) no capítulo Sobre as Máquinas, de seu principal livro, e que ficou conhecido na história do pensamento econômico como “efeito Ricardo”.
Agora, o “efeito Ricardo” explode com todas suas potencialidades no atual período de recuperação da maior economia do planeta. Em vez de contratar novos trabalhadores, observa o Wall Street Journal, empresas como Sunny Delight e a fabricante de motosserras Stihl AG estão investindo em tecnologia e outros meios de tornar as suas operações mais rápidas e mais produtivas.

A economia política vulgar, ao contrário de Ricardo e Marx, estabelece que investimentos que aumentam a produtividade acabam necessariamente criando empregos e melhorando os padrões de vida. Para eles, o atual surto de mecanização terá efeitos benéficos para ao trabalho no longo prazo. Pura ideologia. Isso tem que ser relacionado ao ciclo econômico, não ser tratado como um movimento linear ou natural, como bobagens acadêmicas de curto ou longo prazo.

SUPERPRODUÇÃO E SUPERPOPULAÇÃO – Os movimentos de contração e de expansão do exército industrial de reserva são determinados pela lei geral da acumulação capitalista, magistralmente descrita por Marx ainda no livro 1 de O Capital. Trata-se de um processo de valorização do capital. Superprodução de capital e criação de uma superpopulação relativa.

Esta lei se manifesta no curto prazo real que estamos verificando no atual período de recuperação cíclica, em que a explosão de investimentos em máquinas e software permite às empresas retardar as contratações e aumentar a taxa de exploração da força de trabalho, ao contrário da evolução pacífica que propagandeia a ideologia capitalista. A criação de um exército industrial de reserva e de uma permanente superpopulação excedente às necessidades da acumulação é a verdadeira lei da população da era capitalista. Nada de tolas e naturais progressões aritméticas e geométricas da população.

O que se destaca neste momento de retomada cíclica é que esse fenômeno típico do regime de exploração capitalista de permanente expulsão do trabalho vivo da produção acontece com maior clareza nesta recuperação do que no passado. Gastos em equipamentos e contratação de força de trabalho apareciam geralmente mais sincronizados na maioria dos ciclos do pós-guerra. Desde que a economia reguladora do sistema voltou a crescer de novo em 2009, as compras de equipamentos e software cresceram 31%, ajustadas pela inflação. No período do pós-guerra, somente na esteira das crises parciais de 1982 e 1970 esses gastos cresceram mais rápido. Já o emprego nas fábricas e setor privado em geral cresceu apenas 1,4% desde 2009. Apenas as recuperações que se seguiram às crises parciais de 1980 e 2001 viram um crescimento menor do que agora.

MAIS DEMANDA E MENOS EMPREGO – Seguindo as descrições da matéria do The Wall Street Journal, Erik Brynjolfsson, um economista do Instituto Tecnológico de Massachusetts (MIT), confirma que as empresas começaram a incrementar seus investimentos com o claro objetivo de reduzir mais pesadamente a força de trabalho na primeira metade da década passada.

O ponto de virada, diz ele, ocorreu durante a crise parcial de 2001/2002, “quando as companhias perceberam que podiam fazer muito mais do que pensavam com menos gente”. Mesmo com o ressurgimento da demanda, as companhias estão mantendo a bola rolando ao gastar mais dinheiro com maquinaria e automação das funções. “É como se a economia tivesse revelado um potencial para reduzir a mão-de-obra que não havia sido concebido até a recessão”, diz Brynjolfsson.

Essa tendência na direção de máquinas e software que reduzem a contratação de mão-de-obra não se limita apenas às fábricas. W. Brian Arthur, um economista do Centro de Pesquisas da Xerox em Palo Alto, Califórnia, diz que as empresas estão cada vez mais usando software e computadores no lugar de pessoas no vasto setor de serviços do país. “Não é somente máquinas substituindo pessoas, embora haja bastante disso”, diz Arthur. “É a digitalização da economia inteira”.

Os Estados Unidos hoje estão atrás apenas do Japão no uso de robôs industriais. Os pedidos de robôs cresceram 41% até setembro de 2011 ante um ano antes, segundo a Associação das Indústrias de Robótica, um grupo comercial do país. Isso ajudou a gerar um boom maior de produtividade da força de trabalho. A produção por hora em empresas não-agrícolas cresceu 6% durante a recuperação 2009/2011. O número de horas trabalhadas cresceu apenas 1,5%.
A demanda por capital fixo aumenta a demanda agregada. Mitch Free, diretor-presidente da MFG.com, um website que fabricantes usam para comprar e vender peças e embalagem, diz que a economia fraca produziu um mercado comprador para empresas para empresas em busca de equipamento e software. “Ainda ouvimos que empresas estão com dificuldades em obter crédito”, diz ele, “mas aquelas que estão conseguindo comprar estão adorando as pechinchas em equipamentos que estão conseguindo neste momento”

A Sunny Delight está gastando US$ 70 milhões para expandir suas cinco fábricas de suco nos EUA, um investimento anual recorde para a companhia. Uma grande parte destes gastos destina-se a renovar um velho complexo situado sobre a ferrovia em Littleton, Massachusetts, nos arredores de Boston. Entre as melhorias, está uma nova e iluminada “sala de injeção”, onde máquinas injetam quatro sabores de suco simultaneamente numa linha de alta velocidade. Antes, os sabores eram injetados em linhas separadas, espalhadas por cantos diferentes da planta. Cada linha requeria um operador. Apenas duas pessoas devem controlar a nova linha combinada.

Para o início do próximo ano a empresa também espera que veículos automatizados substituam a frota de empilhadeiras da fábrica e seus operadores. “Algumas pessoas que hoje operam empilhadeiras passarão a supervisionar os veículos automatizados”, diz o gerente da planta, Dan Gray, circulando pelas cavernosas instalações, onde um líquido quente fluindo por canos suspensos exala um aroma adocicado. “Mas os outros terão que mudar para outros trabalhos na planta.” O resultado final será muito menos homens a povoar as linhas de produção. Quando a renovação do capital fixo terminar, Littleton terá menos 30% dos seus trabalhadores originais.

Um comentário:

  1. Noleto,

    Belo texto. Republicado em:
    http://frederico2010.blogspot.com.br/2012/04/homem-x-maquina.html

    Abraços,

    Frederico Luiz

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